Diagnóstico

Diagnóstico socioambiental de organizações coletoras de sementes no Cerrado

O Cerrado, localizado no Planalto Central do Brasil, é um mosaico de diferentes tipos de vegetação – distribuídos entre formações campestres, savânicas e florestais. Sua cobertura original ocupava cerca de 25% do território nacional, com ocorrência em 11 estados brasileiros e faz conexão com importantes biomas, como a Amazônia, Caatinga, Pantanal e Mata Atlântica. Essa ampla diversidade de paisagens e espécies posiciona o Cerrado entre os ecossistemas mundiais classificados como “hotspots” – os biomas mais biodiversos e ameaçados do planeta. As principais nascentes e áreas de contribuição hídrica de oito das doze grandes bacias hidrográficas do país residem no Cerrado, chamado de “Berço das Águas”. Esse bioma é crucial para o abastecimento de água de diversas regiões brasileiras – do Norte ao Sudeste.

Frente ao avanço das fronteiras agrícolas, a organização de redes de sementes no Cerrado tem se consolidado como um ato de resistência às ameaças que incidem sobre os territórios de Povos Indígenas, Quilombolas, Povos e Comunidades Tradicionais e Agricultores Familiares (PIQPCTAF). Na Araticum, trabalhamos com o propósito de promover um bioma conservado, restaurado e com protagonismo das comunidades locais. Assim, neste diagnóstico participativo buscamos ampliar o conhecimento sobre os contextos, motivações e desafios enfrentados pelas organizações, assim como compreender os pontos que demandam fortalecimento.

O trabalho foi desenvolvido juntamente a 07 organizações comunitárias coletoras de sementes, presentes em 06 estados do Cerrado (GO, DF, MG, BA, TO e PA) em 2025 e aproximadamente 150 coletoras e coletores de sementes estiveram presentes nas rodas de conversa. As redes são compostas majoritariamente por mulheres (66,7%), por outro lado, possuem baixa representatividade de jovens (17,9%). Dentre as organizações que participaram do diagnóstico, 100% atuam na coleta e beneficiamento de sementes; 71% também comercializam e 57% executam ou gerem projetos.

A coleta de sementes gera renda, autonomia e bem-estar. As comunidades reportaram que os principais benefícios que desejam receber a partir da semente são geração de renda (29%), recuperação ambiental (23%), saúde e bem-estar (16%), água (13%) e fortalecimento cultural (6%). As principais motivações mencionadas para trabalhar com coleta de sementes foram:

As organizações destacam que a prática estimula um novo olhar sobre a natureza e o Cerrado, ampliando o conhecimento sobre espécies nativas e dinâmicas ambientais. Nesse sentido, 83% relataram que a conscientização ambiental é a principal transformação trazida pela semente nas comunidades. As mulheres associam a coleta à “terapia da cabeça aos pés”, sendo uma atividade que fortalece a autoestima e os vínculos comunitários.

O QUE MUDOU NA CULTURA LOCAL COM A COLETA DE SEMENTES NATIVAS?

MUDANÇAS
Conscientização ambiental
Valorização da coleta de sementes
Geração de renda
Reconhecimento social
33%
Reconhecimento social e fortalecimento da autoestima
67%
Geração de renda e de novas oportunidades de trabalho
67%
Valorização e respeito ao trabalho de coleta de sementes
83%
Conscientização ambiental sobre a Conservação do Cerrado

Contudo, durante as conversas realizadas nos territórios, foram expostos também os desafios enfrentados relacionados à coleta de sementes. Dentre eles, estão a falta de regularização fundiária que dificulta o acesso a políticas públicas; necessidade de melhor infraestrutura e logística relacionadas à semente  (transporte, armazenamento, equipamentos); baixa participação da juventude nas atividades de coleta e sentimento de insegurança das mulheres para coletarem sozinhas.

Os resultados mostram que as organizações apresentam um grau significativo de participação comunitária e estruturação interna, mas ainda enfrentam desafios quanto à autogestão, segurança financeira, infraestrutura adequada e acesso ao mercado. A forte presença feminina, representando mais da metade dos membros, é um indicador positivo para o avanço da igualdade de gênero, mas requer ações específicas para assegurar o bem-estar das mulheres e protagonismo na tomada de decisão.

Os relatos das coletoras e coletores participantes do diagnóstico revelam que a geração de renda constitui uma motivação central para o envolvimento com a coleta de sementes, proporcionando melhorias significativas nas condições de vida das famílias. No entanto, os impactos positivos da atividade vão além da dimensão econômica: a coleta de sementes atua como um catalisador de transformações afetivas, ecológicas, sociais e culturais. 

Ao promover a participação social, a equidade de gênero e a conservação ambiental, as redes de sementes de base comunitária demonstram potencial para contribuir de forma integrada para a maioria dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030, estabelecida pelas Organizações das Nações Unidas. As coletoras e coletores de sementes são atores sociais essenciais para a construção de um futuro mais justo para o Cerrado e para as comunidades que nele vivem.

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